Relato: 8º ENCONTRO DE CICLOTURISMO por WAGNER JOSÉ SARAIVA

Até o ano de 1994 não tinha tido qualquer contato com o cicloturismo e, praticamente, não sabia nada a respeito. Tudo começou naquele ano, quando fui trabalhar em Roraima, onde permaneci por oito anos. Surpreendentemente, passei a ver esses viajantes de bicicleta, todos estrangeiros (sempre europeus), passando por Boa Vista, depois de terem atravessado boa parte da floresta amazônica, inclusive por reservas indígenas, pedalando em direção à Venezuela. Não passava um ano sem que avistasse pelo menos 3 desses turistas. A razão dessa concentração de cicloturistas, passando por Roraima é, sem dúvida, a mesma para outra peculiaridade que se observa nos céus de Boa Vista à noite: dezenas de aviões, que mais parece fila de automóveis numa rodovia, indo para o hemisfério norte, ou vindo de lá. O motivo desse intenso tráfego aéreo por aquela região se deve ao fato de Boa Vista ficar na reta que liga o sul ao norte das Américas, portanto, para os cicloturistas que vão da America do Sul para a América Central ou do Norte, aquele é o caminho mais direto. Sou adepto de atividades esportivas, destacando-se a corrida que já pratico há uns 40 anos (atualmente tenho 61), mas quanto ao ciclismo, apenas fazia raros e eventuais passeios. Assim, induzido pelo exemplo daqueles desbravadores europeus (ou daqueles gringos malucos e aventureiros, como dizia a população de Boa vista) resolvi ingressar nessa modalidade ciclística. Partindo de Boa Vista, realizei viagens às cidades fronteiriças da Guiana e da Venezuela. Atualmente, residindo em Vespasiano/MG, adoro pedalar pelas montanhosas regiões circunvizinhas, como Lagoa Santa, Confins, Serra do Cipó, entre outras. Vez ou outra vou à Divinópolis, distante 170 km daqui. Há algum tempo tomei conhecimento do CLUBE DE CICLOTURISMO, e sempre recebia convites para participar de seus encontros. Foi desta vez a minha primeira participação neste importante evento dedicado aos amantes do cicloturismo, que ocorreu numa colônia de férias a 16 km ao norte da bela cidade paulista de Campos do Jordão. Tinha um enorme interesse em conhecer pessoas como Eliana Garcia, Rodrigo Telles e outros que lá estavam, e que são referência no cenário do cicloturismo brasileiro. Assim ocorreu a minha jornada: Dia 03/09/2009 Às 20:45 Embarquei na Rodoviária de Belo Horizonte para Campos do Jordão, com a bicicleta devidamente acomodada na mala bike. Tive que ser muito convincente para evitar que me cobrassem uma taxa extra pelo transporte da bicicleta. Rodoviária BH, início da viagem Rodoviária BH, início da viagem Dia 04/09 Por volta de 9 horas da manhã, depois de ter mudado de ônibus em Taubaté, desembarquei no terminal rodoviário de Campos do Jordão. Após deixar meus pertences guardados (mala bike e alforjes) fiz um extenso passeio na cidade. Desembalando a bike na Rodoviária de Campos do Jordão Desembalando a bike na Rodoviária de Campos do Jordão Campos do Jordão é uma bela cidade que chama à atenção a primeira vista. Muito bonita a sua arquitetura de estilo europeu – suíço ou bávaro, não sei exatamente. Belos, também, são seus bem cuidados jardins e bosques. Contudo, não pude deixar de notar aglomerado de casas nos morros que margeiam a longa e principal avenida da cidade. Casas simples que, embora tentando imitar o estilo europeu, pareceram-me favelas com certa maquiagem. Fazer o que? Afinal é esta a realidade brasileira. Após ter andado bastante pela cidade, o que incluiu um passeio de bonde, por volta das 13 horas iniciei a viagem para o local do encontro, o Espaço Araucária. Local do encontro de cicloturismo Local do encontro de cicloturismo Foram 16 km de pedalada num trecho bem pesado com longas subidas, contudo, a beleza das paisagens compensou o esforço. Já no local do evento, aos pouco iam chegando mais e mais ciclistas. A maioria de carro. Mas alguns, como eu, lá chegaram pedalando. Entre esses, estava a Vilma, uma jovem e simpática avó paulistana que veio pedalando com uma turma de São Paulo. Vieram de bike até a periferia da cidade de Tremembé, no local onde começa a longuíssima subida de 20 km da Serra da Mantiqueira. Deste ponto pegaram carona com outros companheiros que iam de carro para o encontro. Um ciclista de 72 anos, Vilma a jovem avó ciclista e eu Um ciclista de 72 anos, Wilma a jovem avó ciclista e eu Dias 05, 06 e 07 de setembro Foram os dias do encontro. A qualidade e organização desse evento extrapolaram as minhas expectativas, tanto que procurarei não faltar aos próximos. Uma das palestras Uma das palestras As palestras e os depoimentos foram muito proveitosos e interessantes. Tudo isso sem contar com a beleza dos passeios matinais naquela bucólica região da Mantiqueira. Início de um passeio matinal Início de um passeio matinal Dia 07/09 Às 13:30 tem início o meu retorno, de bicicleta, do encontro. Tinha pela frente 63 km a percorrer, com bagagem em torno de 16 kg, até a cidade de Taubaté, onde deveria embarcar num ônibus para Belo Horizonte, no horário de 19:45. O começo da viagem de volta O começo da viagem de volta Dos 16 km até Campos do Jordão, pelo menos 11 km foram de pura subida e quase tudo de terra. Logo na saída há uma de 3 km, depois outra de 1 km e, por último, um longo e interminável trecho de 7 km, que começa no local onde cruza com o Caminho da Fé (um caminho de peregrinos que vai de Tambaú, no interior de São Paulo, atravessando a Serra da Mantiqueira, pelo sul de Minas Gerais até Aparecida do Norte), próximo das fontes de água mineral, a INDAIÁ e MINALBA. Neste ponto a estrada passa a ser asfaltada, mas mesmo assim não diminuiu o grande esforço para dominar esse trecho de serra que, com persistência, foi vencido numa relação de marcha de 1:1. Para compensar o esforço, chega-se a Campos do Jordão numa longa descida de quase 2 km. Em Campos do Jordão pude, mais uma vez, comprovar que as pessoas são gentis e receptivas com os cicloturistas. Tal ocorreu numa loja de chocolate onde, após comprar umas barrinhas desse restaurador alimento, tive permissão da moça que me atendeu, para encher meu camel back numa torneira além do balcão. A minha aparência de quase ET: capacete, malha suada, salpicada de barro e colada ao corpo, desembarcando de uma bicicleta abarrotada de bolsas, não assustou a moça. Pelo contrário, ela até ficou curiosa em saber de onde eu vinha, para onde ia e por que estava viajando de bicicleta. Às 16:50 tirei a última foto da viagem no alto de um mirante, na saída de Campos do Jordão, onde começa a longa descida da Serra da Mantiqueira. Devido ao já avançado horário, não deixei de sentir uma pequena preocupação, pois dispunha de pouco mais de 2 horas e 50 km de percurso, para chegar a Taubaté, onde deveria embarcar às 19:45. Contudo, como os próximos 20 km seriam somente de descida, senti-me mais aliviado. Desci a Serra numa velocidade entre 30 a 60 km. Vários colegas do encontro passavam por mim e cumprimentavam-me com toques na buzina. Ao terminar de descer a serra comecei a ter, de fato, alguma preocupação, pois já era 17:40 e ainda faltava 30 km para chegar no terminal rodoviário. Não poderia, em hipótese alguma, fazer uma média inferior a 15 km. Assim, iniciei esta etapa com pedaladas vigorosas num trecho plano, mas com uma ou outra subida suave, que às vezes reclamava a relação 2:5. Às 18:50, já no centro da cidade de Tremembé, faltando 10 km para a rodoviário, parei numa banca que vendia água de coco. Apesar de ter o cuidado de manter uma boa hidratação, ainda consegui beber a água de dois cocos. Não consegui fazer este último e decisivo trecho no tempo que esperava fazê-lo, em razão de ser na via urbana, com semáforos e carros atrapalhando. Outro problema foi que, embora tivesse traçado um minucioso mapa para esse trecho, na maioria das vezes não conseguia me localizar devido à falta de placas nas ruas. Finalmente, ufa!!, às 19:30 consegui chegar no Terminal Rodoviário de Taubaté. Apressadamente retirei dos alforjes roupas limpas e corri ao banheiro, onde tomei um “banho” com toalha umedecida. Tive que fazer tudo muito rápido, pois quando retornei o ônibus já estava na plataforma. Apenas inverti a posição dos pedais e assim, com alforjes mesmo, a magrela foi acomodada num canto do bagageiro. Após uma confortável e relaxante noite de viagem amanheci em Belo Horizonte e com mais 40 minutos de viagem, num ônibus que seguia para o Aeroporto de Confins, desci no trevo de Vespasiano. Ao entrar “triunfantemente” na cidade pedalando a minha bicicleta carregada de alforjes, senti-me como um verdadeiro “herói” que retorna de mais uma “aventura”. Mais fotos do Encontro de Cicloturismo Mirante em Campos do Jordão, no começo da descida da Serra da Mantiqueira Mirante em Campos do Jordão, no começo da descida da Serra da Mantiqueira O mais novo ciclista do encontro - 9 anos O mais novo ciclista do encontro - 9 anos Serra da Mantiqueira, Campos do Jordão (SP) Serra da Mantiqueira, Campos do Jordão (SP) Um momento de descanso Um momento de descanso Uma cena marcante Uma cena marcante

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